Escrever sobre a educação e, principalmente, sobre as escolas hoje em dia, normalmente nos coloca em dois círculos bem correlatos e estratégicos: os impactos da pandemia nos processos pedagógicos e nas políticas públicas educacionais, ou sobre os caminhos que precisamos seguir para correr atrás do prejuízo.
Hoje opto por falar do segundo aspecto. E sobre ele, tratar de uma estrada para a qual não haverá atalho: o poder público precisará focar na alfabetização como um eixo estratégico do trabalho nas escolas este ano e nos próximos.
Com base na nota técnica do Todos pela Educação (embasada na pesquisa do Pnad Contínua – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) é possível estimar que entre 2019 e 2021, houve um aumento de 66,3% no número de crianças de 6 e 7 anos de idade que, segundo seus responsáveis, não sabiam ler e escrever.
Trata-se de uma pesquisa declaratória (respondida pelos responsáveis das crianças), e por isso questionável em alguns aspectos. Mas é emblemática por trazer um cenário aterrador para a educação brasileira. Isso pode significar que mais de 2,5 milhões de crianças deixaram de se alfabetizar na idade certa em todo o país.
E qual o caminho para virar o jogo? Para qualquer processo de recomposição de aprendizagens, o primeiro passo indicado é fazer um bom diagnóstico da situação das crianças. Entender até onde as crianças avançaram é o primeiro passo.
A alfabetização é um processo estruturado e que torna possível dividir as crianças a partir dos estágios de avanço individuais do aprendizado. Isso significa traçar qual o perfil de cada aluno (um exemplo usual de classificação dos alunos é: Pré-Silábicos, Silábicos, Silábico-Alfabéticos e Alfabéticos). Após o nivelamento dos estudantes, é necessário garantir que o planejamento pedagógico foque nas dificuldades, para que possam progredir com mais velocidade no percurso formativo a partir de atividades pedagógicas direcionadas às lacunas de aprendizagem de cada um.
Temos um bom exemplo de mapeamento de dificuldades de alfabetização consolidado nas escolas de Caruaru-PE no início de 2022, com a construção de uma ferramenta de monitoramento chamada de “Alfabetômetro”. Trata-se de um Power BI (um painel interativo de visualização de dados) alimentado por dados de sondagem dos estudantes em todas as turmas do primeiro ao quinto ano do Ensino Fundamental.
O painel funciona como um termômetro, que identifica os níveis de aprendizado dos estudantes das escolas da rede municipal, e permite visualizar em diferentes níveis, qual o percurso de alfabetização precisa ser planejado até que todos sejam classificados como plenamente alfabetizados.
Para os professores, ele é útil pois permite planejar as aulas com base nas dificuldades reais de cada aluno, reorganizando o trabalho para atender as suas lacunas. Para a secretaria de educação, a ferramenta permite identificar quais as escolas com mais dificuldade, bem como identificar se é necessário produzir materiais de apoio ou fortalecer a formação dos professores em algum ano específico do ciclo de alfabetização.
Independente da estratégia adotada pelas escolas ou pelas secretarias de educação, o ponto central é que a alfabetização seja colocada com um eixo basilar do planejamento estratégico, planejada a partir de um bom diagnóstico, onde cada estudante possa ser atendido de acordo com as suas necessidades reais de aprendizagem.
João Paulo Cêpa é ex-secretário de Educação e Esportes de Caruaru-PE, consultor educacional e gerente de Articulação e Advocacy do Movimento pela Base
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